Região Metropolitana de Fortaleza
A reforma urbana e o direito à cidade são temas transversais aos capítulos desenvolvidos neste livro. Em termos de estrutura, o volume está subdividido em três partes. A primeira parte é constituída pelos capítulos "Metrópole como negócio e precarização da vida cotidiana" e "Desigualdade socioeconômica, vulnerabilidade e negação ao direito à cidade", escritos, respectivamente, por José da Silva e Maria Clelia Costa. No primeiro, Silva analisa Fortaleza a partir do movimento da Reforma Urbana, inclusive o Estatuto da Cidade. Já Costa discute o impacto das políticas econômicas e sociais na qualidade de vida da população.
A segunda parte traz à tona o debate acerca do planejamento e dos instrumentos urbanísticos. No capítulo escrito por Renato Pequeno, "Conflitos e contradições nos processos de planejamento urbano em Fortaleza: regimes urbanos, regulamentação seletiva e governança conflituosa", os regimes urbanos serão explicados à luz da crítica ao Estado e ao modelo de governança. Nos dois capítulos seguintes, "A atual defesa das ZEIS em Fortaleza: da organização comunitária à articulação em rede e os embates institucionais" e "A ZEIS como instrumento da reforma urbana", sob responsabilidade de Valeria Pinheiro e Joisa Barroso, respectivamente, atenção será dada às formas pelas quais as ZEIS foram pensadas. Para finalizar esta parte, Eduardo Machado et al apresenta "O direito à cidade na trajetória do movimento popular-comunitário no século XXI: questões teórico-empíricas a partir do caso do Grande Bom Jardim, Fortaleza, Ceará", onde expõe como o direito à cidade foi compreendido em diferentes processos e momentos.
Na terceira e última parte, três capítulos indicam temas centrais para superar as desigualdades em Fortaleza. O capítulo de Alexsandra Muniz, "Economia urbana e mercado de trabalho em Fortaleza no contexto de pandemia da Covid-19", enfrenta o tema das transformações no mundo do trabalho. Escrito por Eustógio Dantas et al, Lazeres, "Lazeres, turismo e o direito à vida na cidade de Fortaleza", contribui ao discutir o processo de reprodução da cidade de Fortaleza na sua frente marítima. Por último, em tema contemporâneo, Iara Gomes escreve o capítulo "Desafios e novas possibilidades para a produção de alimentos na metrópole", demonstrando a importância das metrópoles no processo de consumo e produção de alimentos.
Organização: Alexandre Queiroz Pereira (UFC) e Maria Clelia Lustosa Costa (UFC)
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Sumário
Introdução | Autores: Alexandre Queiroz Pereira e Maria Clelia Lustosa Costa
Parte I | COMO ANDA FORTALEZA NO SÉCULO XXI
Capítulo 1 | Metrópole como negócio e precarização da vida cotidiana. Autores: José Borzacchiello da Silva
Capítulo 2 | Desigualdade socioeconômica, vulnerabilidade e negação ao direito à cidade. Autores: Maria Clelia Lustosa Costa
Parte II | REGIMES URBANOS E GOVERNANÇA
Capítulo 3 | Conflitos e contradições nos processos de planejamento urbano em Fortaleza: regimes urbanos, regulamentação seletiva e governança conflituosa. Autores: Renato Pequeno
Capítulo 4 | A atual defesa das ZEIS em Fortaleza: da organização comunitária à articulação em rede e os embates institucionais. Autores: Valeria Pinheiro
Capítulo 5 | A ZEIS como instrumento da reforma urbana. Autores: Joisa Barroso
Capítulo 6 | O direito à cidade na trajetória do movimento popular-comunitário no século XXI: questões teórico-empíricas a partir do caso do Grande Bom Jardim, Fortaleza, Ceará. Autores: Eduardo Gomes Machado (UNILAB), Adriano Paulino de Almeida (CDVHS), Alexandre Queiroz Pereira (UFC) e Rogério da Costa Araújo (CDVHS)
Parte III | DIMENSÃO ECONÔMICA: COVID-19, FRAGILIDADES E POTENCIALIDADES
Capítulo 7 | Economia urbana e mercado de trabalho em Fortaleza no contexto de pandemia da Covid-19. Autores: Alexsandra Maria Vieira Muniz
Capítulo 8 | Lazeres, turismo e o direito à vida na cidade de Fortaleza. Autores: Eustogio Dantas, Alexandre Pereira e Regina Balbino
Capítulo 9 | Desafios e novas possibilidades para a produção de alimentos na metrópole. Autores: Iara Rafaela Gomes e Gabriela de Azevedo Marques
Conclusão | Autores: Alexandre Queiroz Pereira e Maria Clelia Lustosa Costa
Capítulos
Introdução | Autores: Alexandre Queiroz Pereira e Maria Clelia Lustosa Costa
A reforma urbana e o direito à cidade são temas transversais aos capítulos desenvolvidos neste livro. Fruto das experiências empíricas e teóricas dos pesquisadores do Núcleo Fortaleza, a coletânea propõe interpretação urbana crítica, atualizada e propositiva. Afinado ao projeto nacional do Observatório das Metrópoles, os textos deparam-se com o grande desafio de dialogar com os leitores ao passo que diagnosticam os principais problemas da cidade de Fortaleza no início do século XXI. Não se contentando com a descrição dos casos, o livro vai além ao indicar proposições e possibilidade para superação coletiva de quadro de desigualdades reinantes desde a formação urbana da capital alencarina.
Parte I | COMO ANDA FORTALEZA NO SÉCULO XXI
Capítulo 1 | Metrópole como negócio e precarização da vida cotidiana. Autores: José Borzacchiello da Silva
O artigo analisa Fortaleza a partir do movimento da Reforma Urbana, inclusive o Estatuto da Cidade, salientando o alcance social sob a lógica da democratização do direito pautada no princípio da função social da propriedade e da cidade. A base empírica da análise será o centro da cidade, importante polo de comércio e de serviços que reage a transformação da cidade em uma mercadoria, pautada na espetacularização morfológica e estrutural e nos moldes do empresariamento urbano. Serão consideradas as sucessivas mudanças na estrutura urbana da cidade nas últimas décadas. Como outras metrópoles brasileiras, Fortaleza também passou por um processo de desaceleração demográfica a partir dos anos de 1980, o que, no entanto, não interrompeu seu dinamismo, evidenciado no processo de reestruturação espacial com implantação de sistema integrado de transporte urbano e de equipamentos de grande porte (condomínios residenciais, shoppings center), reforçando antigas e criando novas centralidades, acentuando as desigualdades sociais, alterando, sobremaneira as funções do centro da cidade. A proliferação de setores de classe média impõe novas leituras das relações centro-periferia, especialmente, no tocante às dificuldades de acesso à moradia de caráter social. Será enfocado o modelo de gestão urbana pautado nos conceitos de governança e de governabilidade e seus impactos na cidade. A pandemia da Covid-19 afetou sensivelmente o centro da cidade e seus efeitos também serão discutidos.
Capítulo 2 | Desigualdade socioeconômica, vulnerabilidade e negação ao direito à cidade. Autores: Maria Clelia Lustosa Costa
No final do século XX, o Ceará passou por uma reestruturação socioeconômica, com decadência da agricultura tradicional e crescimento da comercial, expansão da indústria e de atividades de turismo e lazer e inserção de novos produtos na pauta das exportações, que contribuíram para aumentar o PIB estadual, mas que não foram suficientes para mudar o quadro de miséria no estado e diminuir a desigualdade socioeconômica. Com a edição do Plano Real ocorre a estabilização dos preços a partir de 1994, consolidando a recuperação do poder de compra do salário mínimo desde a década de 1950. Na década inclusiva (2000-2010), segundo o IPEA (2010), o Estado Social brasileiro aumentou sua capilaridade no território nacional pela ampliação do mercado de trabalho formal, aumento real do salário mínimo, previdência social, implantação do Bolsa Família e de programas de benefícios de prestação continuada, propiciando, em alguns períodos, a redução da desigualdade social, da pobreza e vulnerabilidade social. Relatório da FAO, de 2013, apontava para a redução da pobreza e da miséria no Brasil, com a criação do programa Fome Zero, em 2003 e do Bolsa Família. As políticas públicas implementadas no período de 2000-2010 pelo governo federal, estadual e municipal foram fundamentais na redução da vulnerabilidade social em Fortaleza. Araújo (2015), ao calcular os índices de vulnerabilidade social (IVS) em Fortaleza, com base nos dados dos censos demográficos do IBGE (2000 e 2010), utilizando as variáveis renda, educação e qualidade da habitação dos diferentes grupos sociais que compõem a cidade, constatou este fato, que garantiram melhores condições de vida a população e de acesso as estruturas de oportunidade (educação, emprego e moradia). No entanto, na fase de inflexão neoliberal, com a erosão do papel do Estado e com o desmonte das políticas públicas, pós-2016, há uma redução de investimentos no campo da assistência social, da saúde e da educação, que alcança, prioritariamente, os grupos mais vulneráveis. A crise econômica, o crescimento do desemprego e o achatamento do salário mínimo provocaram o aumento da miséria, e com isto o Brasil retorna ao mapa da fome e aumenta da vulnerabilidade social. As crises econômica e política foram acentuadas pela crise sanitária, a pandemia de Covid-9, e pelos conflitos entre as esferas de poder. Neste artigo será apresentada a RMF (década de 2000-2020), ressaltando as dimensões socioeconômicos, espaciais e ambientais das desigualdades e segregação que caracterizam as metrópoles contemporâneas. Discutirá o impacto das políticas econômicas e sociais na qualidade de vida da população garantindo ou negando-lhes a reprodução das condições dignas de vida, o direito de habitar, usar, ocupar, produzir, governar e desfrutar das cidades de forma igualitária.
Parte II | REGIMES URBANOS E GOVERNANÇA
Capítulo 3 | Conflitos e contradições nos processos de planejamento urbano em Fortaleza: regimes urbanos, regulamentação seletiva e governança conflituosa. Autores: Renato Pequeno
Por meio da análise dos processos de planejamento urbano realizados em Fortaleza desde 2006, pretende-se evidenciar o quadro de transformações territoriais atreladas aos instrumentos de indução do desenvolvimento urbano. Adota-se Fortaleza como recorte espacial, capital onde residem mais 2,6 milhões de habitantes, integrante de região metropolitana, composta por 19 municipalidades, reunindo mais de 4,1 milhões de pessoas. Parte-se da hipótese de que neste período os princípios que norteiam a política nacional de desenvolvimento urbano têm sido confrontados, desvalorizados e subutilizados, prevalecendo os interesses dos agentes hegemônicos reunindo setores produtivos e imobiliário. Para tanto, foram analisadas as condições dos arranjos institucionais diretamente envolvidos com a política urbana no âmbito municipal, os processos para a elaboração do plano diretor municipal, assim como a sua implementação e regulamentação, avistando-se inclusive o início recente de sua revisão. Constata-se que ao mesmo tempo em que prevalecem dificuldades para implementação de institutos urbanísticos e planos setoriais voltados para o combate às desigualdades sociais sugeridos desde a agenda da reforma urbana, tem ocorrido facilidades para que as parcerias público-privadas se disseminem em variadas formas. Em seu conteúdo, inicialmente apresenta-se o quadro de agentes envolvidos, em seus papéis e interesses, bem como as arenas de debate e instâncias de controle social vinculadas à política urbana. Em seguida, as análises se concentram nos instrumentos de indução do desenvolvimento urbano como as operações urbanas consorciadas, as outorgas onerosas do direito de construir e de alterar o uso do solo, as transformações no zoneamento, e os projetos especiais conflituosamente aprovados; todos vinculados com programas de desenvolvimento de matriz mercadófila. Ao final, intenta-se explicitar as vinculações de intervenções de interesse do setor imobiliário com as alterações em curso no processo de estruturação da RMF, revelando as violações ao direito à cidade e o acirramento das desigualdades socioespaciais. Importante mencionar que os resultados apresentados decorrem de pesquisa-ação na qual atuamos com outros pesquisadores componentes do Laboratório de Estudos da Habitação (Lehab-UFC), integrante do Núcleo Fortaleza do Observatório das Metrópoles. Como procedimentos metodológicos destaca-se: a leitura de relatórios, a construção de cartografia temática, o acompanhamento de reuniões de conselhos municipais e audiências públicas, a realização de entrevistas semiestruturadas. Ressalta-se a realização de oficinas e cursos de extensão voltados para compartilhar constatações junto a movimentos, entidades e demais parceiros no sentido de validá-las e enriquecê-las.
Capítulo 4 | A atual defesa das ZEIS em Fortaleza: da organização comunitária à articulação em rede e os embates institucionais. Autores: Valeria Pinheiro
Instrumento bastante celebrado pelo campo da reforma urbana pelo seu potencial transformador, a instituição de Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) em Fortaleza se deu de maneira bastante atrasada, se comparada às demais grandes cidades brasileiras. No plano diretor de 2009 foram reconhecidas 45 ZEIS de ocupação, 58 de conjuntos habitacionais e 34 de vazios. A trajetória da sua implementação na cidade é permeada de armadilhas, contradições e significativas e dificultosas vitórias. A articulação de comunidades gravadas como ZEIS de ocupação se dá notadamente através da Frente de Luta por Moradia Digna (FLMD), que contempla, em sua rede, nove das dez ZEIS consideradas prioritárias pela Prefeitura Municipal. Além disso, recentemente, se obteve o reconhecimento da 11ª ZEIS Prioritária, a do Cais do Porto, também a partir de movimentações apoiadas pela FLMD e organizações locais. Pretende-se neste artigo visibilizar a atual conformação da luta pela efetivação deste instrumento na cidade, o seu rebatimento institucional e a organização dos territórios na demanda por sua implementação nos últimos anos. A importância de discorrer sobre este tema se dá pela perspectiva de se obter, com a implementação efetiva de um instrumento jurídico urbanístico, a concretização de uma experiência de planejamento urbano territorial, com segurança da posse e exercício de uma gestão democrática, na efetivação do direito à cidade. A mediação desta disputa por um modelo contra hegemônico de cidade torna-se, na conjuntura atual, tão difícil quanto necessária.
Capítulo 5 | A ZEIS como instrumento da reforma urbana. Autores: Joisa Barroso
Neste capítulo, parte-se da hipótese de que as Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) são um instrumento de acesso à terra urbanizada/bem localizada pela população de baixa renda, com a garantia da propriedade da moradia, implementado em um processo que obrigatoriamente tem que acontecer com gestão democrática e participação dessa população. Enquanto instrumento da política urbana prevista na Lei No 10.257/2001 – Estatuto da Cidade, somente em 2009 foram incorporadas ao Plano Diretor do município de Fortaleza, quando dezenas ZEIS de diferentes tipos foram delimitadas. Para sua regulamentação as ZEIS de Favelas necessitam ter elaborados seus Planos Integrados de Regularização Fundiária (PIRF) dos quais tomam parte, entre outros componentes: o diagnóstico, o plano urbanístico, o plano de regularização fundiária, o plano de geração de trabalho e renda, o plano de desenvolvimento social e a lei de Normatização Especial da ZEIS. Sob esse contexto, o presente capítulo teve como objetivo analisar os primeiros PIRF elaborados em 2019, sendo composto pelas seguintes partes: I – o contexto de atuação dos agentes sociais na elaboração dos PIRF; II – a cidade da favela constatada a partir dos diagnósticos elaborados; III – a cidade flexível/legal onde trataremos do aspecto normativo, da forma de consenso em torno dos parâmetros, segundo níveis de participação, confrontado ao que já está posto na legislação urbanística local, dimensionando o alcance da regularização fundiária por meio da regulamentação definitiva da ZEIS; IV – a cidade “desejada”, onde serão verificados os processos de elaboração dos planos urbanísticos/PIRF em si, suas eventuais relações com questões sociais, culturais e econômicas locais. Constatou-se que, enquanto instrumento estratégico da agenda da reforma urbana norteado pelo princípio do Direito à Cidade, a ZEIS e seus processos de implementação pelo Estado não são assumidos enquanto prioridade e não se articulam com as políticas de planejamento territorial e produção habitacional. Os PIRF, entre outras limitações, foram elaborados em tempo exíguo, inadequado a sua apropriação pelos moradores o que, para além de comprometer seus processos de implementação, dificulta a efetiva regulamentação das ZEIS no município de Fortaleza. E que, mesmo em um cenário tão adverso enfrentado por estas primeiras experiências, as ZEIS e processos como os de elaboração dos PIRF, persistem enquanto importantes instrumentos de mobilização e luta dos movimentos sociais locais.
Capítulo 6 | O direito à cidade na trajetória do movimento popular-comunitário no século XXI: questões teórico-empíricas a partir do caso do Grande Bom Jardim, Fortaleza, Ceará. Autores: Eduardo Gomes Machado (UNILAB), Adriano Paulino de Almeida (CDVHS), Alexandre Queiroz Pereira (UFC) e Rogério da Costa Araújo (CDVHS)
Analisaremos como o movimento popular-comunitário do Grande Bom Jardim (GBJ) incorpora o direito à cidade enquanto vetor teórico-prático de atuação político-técnica, com foco na Rede de Desenvolvimento Local, Integrado e Sustentável do Grande Bom Jardim (Rede DLIS do GBJ), instituída em 2003. Esta Rede agrega dezenas de componentes, dentre organizações da sociedade civil, associações comunitárias, fóruns, coletivos e grupos religiosos. O GBJ, com população atual em torno de 220 mil habitantes e agregando cinco bairros e dezenas de assentamentos precários, é uma periferia marcada por segregação socioespacial de larga escala e por intensa vulnerabilidade social e precariedade urbana em Fortaleza. Ao mesmo tempo, possui um movimento popular-comunitário denso, complexo e potente, que articula, pelo menos, cinco décadas e quatro gerações em sua atuação. Nosso foco será entender como o direito à cidade foi compreendido e incorporado em diferentes processos e momentos, impactando a atuação política na luta pela justiça social, no enfrentamento a desigualdades e violências e no acesso e garantia de direitos. Faremos isso em diálogo com os referenciais do próprio campo do direito à cidade, considerando vetores essenciais, bem como rupturas, continuidades, contradições e paradoxos. Problematizaremos aspectos das relações entre sociedade política e sociedade civil, tendo como hipótese a existência de implicações relevantes na efetivação de um controle social que alarga – processual e substantivamente – a democracia, mantém a autonomia do movimento popular-comunitário e promove mudanças socioespaciais efetivas. Para tanto, analisaremos documentos, realizaremos entrevistas e sistematizaremos informações e dados gerados através de observação participante, com foco nas conferências locais de desenvolvimento local, integrado e sustentável; no projeto do Rio Maranguapinho; na atuação do Centro de Defesa da Vida Herbert de Sousa (CDVHS), entidade âncora da Rede; e nas lutas das Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) e do Parque Urbano Lagoa da Viúva.
Parte III | DIMENSÃO ECONÔMICA: COVID-19, FRAGILIDADES E POTENCIALIDADES
Capítulo 7 | Economia urbana e mercado de trabalho em Fortaleza no contexto de pandemia da Covid-19. Autores: Alexsandra Maria Vieira Muniz
O surto epidêmico da Covid-19 que eclodiu no ano de 2020 acentuou a crise frente a uma conjuntura econômica recessiva que já vinha se delineando, desdobrando-se em um movimento de inflexão ultraliberal (RIBEIRO, 2017) com forte repercussão na economia e sociedade. Assim, este capítulo tem como objetivo evidenciar os impactos da Covid-19 na estrutura produtiva e mercado de trabalho da metrópole de Fortaleza. Como metodologia foi realizada revisão bibliográfica e utilizados dados secundários do Caged e PnadC. A implantação do isolamento social rígido no Ceará veio acompanhado da restrição no funcionamento das atividades econômicas. O Ceará perdeu mais de 25 mil postos de empregos formais na pandemia em abril de 2020. Por outro lado, atividades, como o comércio eletrônico e o regime de teletrabalho foram intensificados. Para muitos, o trabalho virtual longe do local de trabalho não foi possível, incluindo os de setores como a indústria transformadora, a saúde, os supermercados ou a embalagem e entrega de mercadorias, bem como, trabalhadores de menor qualificação de setores de serviços pessoais, como hospedagem, alimentação e transporte de passageiros. Trabalhadores domésticos, dos quais a grande maioria são mulheres, foram significativamente afetados por perdas de emprego ou reduções das horas de trabalho e ganhos. O quadro atípico da pandemia não é responsável por si só pela queda no quantitativo de empregos, já que a inflexão na trajetória da formalização das ocupações e do desemprego reflete diretamente o quadro recessivo que domina por mais de dois anos a economia brasileira (POCHMAN, 2017). Apesar da queda da população ocupada na capital, notadamente nos picos da pandemia, com a tendência positiva de estabilização desta e a retomada da economia, mantém-se o crescimento dos últimos três meses, pois enquanto no Ceará, em abril do ano corrente foram gerados 5.304 novos empregos, em Fortaleza que concentra o maior quantitativo destes, foram criados 3.234 postos de trabalho, tendo sido o número de contratações com carteira assinada (23.528) superior ao de demissões (20.294). Em termos setoriais, o saldo decorreu, principalmente, da geração de postos de trabalho nos serviços (2.873 novos empregos), seguido pelo comércio (266), indústria (93), construção (10), com baixa de emprego na agropecuária (-8). Por outro lado, o rendimento médio real dos trabalhadores no Ceará é o menor em 10 anos, com uma queda de 14,3%, uma vez que em 2021 foi de R$ 1.556, perante R$ 1.817 em 2020. O direito à cidade, uma cidade construída não só para o negócio, mas comprometida com o acesso ao lazer, ao habitar, ao meio ambiente preservado, ao consumo com qualidade de vida por parte de diferentes agentes que produzem o espaço urbano, perpassa também o direito ao trabalho na cidade. Embora os impactos da pandemia no mercado de trabalho ainda seja difícil de ser dimensionado, as evidências e tendências permitem subsidiar políticas e avaliar ações em andamento.
Capítulo 8 | Lazeres, turismo e o direito à vida na cidade de Fortaleza. Autores: Eustogio Dantas, Alexandre Pereira e Regina Balbino
Nos estudos urbanos, as relações sociais e as espacialidades conduzidas por práticas de lazer foram subestimadas enquanto, potencialmente, capazes de nos ajudar a compreender o cotidiano nas cidades. Há, nestes termos, uma lacuna científica significativa, haja vista, o crescente impacto dos lazeres na reprodução da sociedade urbana. A partir do processo de massificação dos lazeres, no século XX, há uma sensível mudança na produção do espaço urbano. As ações públicas e privadas passaram a produzir formas e funções urbanas, lugares de lazer, integrados a roteiros de visitação para atender demandas locais, nacionais e internacionais. Esta tendência, a que chamaremos de urbanização dos lazeres, acelerou-se e, atualmente, é justificativa para a redefinição de espaços tradicionais como também para incorporação de novas áreas à tessitura urbana. Neste sentido, a literatura específica enumera casos e mais casos de processos de reestruturação urbana em áreas industriais, portuárias ou habitacionais decadentes; redefinidas para zonas de lazer, espaços públicos e/ou sítios turísticos. Seria justo reverter parte dos orçamentos públicos em empreitadas de requalificação urbana, em tese, exclusivas para turistas? Esta é uma pergunta recorrente. Os críticos às práticas turísticas, e por muitas vezes fundamentados nas desigualdades socioespaciais das urbes do Sul Global, fundamentam seus argumentos quando relacionam os processos de gentrificação de áreas, de segregação social e de ampliação de desigualdades socioespaciais ao modelo de turismo implementada nos referidos espaços. A produção desigual do espaço urbano, a saber a dicotomia entre cidade do morador e cidade para os turistas, torna-se ponto de partida para o debate acerca dos direitos de todos os cidadão à espaços urbanos próprios ao lazer. Política e socialmente, aqui nos referimos ao “efeito contraste”, ou seja, a existência de áreas urbanas turísticas justapostas às zonas carentes de infraestruturas e serviços, pode gerar movimentos de reivindicação social, a partir de objetivos e estratégias: i. demanda das classes trabalhadoras pelo direito ao usufruto das zonas turísticas, sobremaneira, os mais jovens e periféricos; ii. para o acesso, ergue-se outra demanda, a melhoria da mobilidade urbana; e, iii. movimentos pelo direito à reestruturação de áreas periféricas à luz dos exemplo das zonas entendidas como as melhor estruturadas na cidade. Para este capítulo, partiremos da produção do espaço situado na frente marítima de Fortaleza, com destaque para dois dos casos mais densamente habitados: o trecho Praia de Iracema-Mucuripe e o outro Pirambu-Barra do Ceará. O primeiro, foi concebido, desde os anos 1960, como espaço de moradia e de lazer das classes média e de alta renda da cidade. O segundo, caracterizado, desde o século XIX, moradia de segmentos pobres da cidade, passou por intervenção urbana, no século XXI, remoção de famílias, e construção de uma via litorânea e de um calçadão à beira-mar.
Capítulo 9 | Desafios e novas possibilidades para a produção de alimentos na metrópole. Autores: Iara Rafaela Gomes e Gabriela de Azevedo Marques
O urbano é multifacetado, e, por essa razão, o direito à cidade é um conceito guarda-chuva que abrange uma série de aspectos, como o acesso à moradia, à saúde, ao trabalho, ao lazer; enfim, aos serviços básicos de manutenção da vida, o que inclui, também, o acesso à alimentação de qualidade. Isto nos faz compreender como não apenas a alimentação, mas todas as práticas relativas a ela, como produção, comercialização e consumo de alimentos, são intrínsecas à dinâmica urbana; uma vez que todas essas atividades socioeconômicas compõem a satisfação da necessidade humana por alimentação. Em relação à comercialização e ao consumo, isto já é dado; contudo, a produção agrícola de alimentos tem sido apenas recentemente reconhecida e abordada pelos estudos espaciais do urbano, que, por muito tempo, associaram categoricamente a agricultura a uma prática, por essência, rural. Este artigo tem o objetivo principal de debater sobre as possibilidades de interlocução entre as práticas de Agricultura Urbana e Periurbana (AUP) e a agenda da reforma urbana e do direito à cidade, analisando as especificidades encontradas na produção de alimentos na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Para embasar a discussão, será realizada uma reflexão teórica a partir de uma abordagem sobre o urbano contemporâneo em consonância de reflexões quanto ao direito à cidade, junto ao atual debate acerca da agricultura urbana e periurbana. Também serão apresentados alguns dados quantitativos do Censo Agropecuário de 2017, bem como informações sobre as iniciativas governamentais mais recentes, incluindo políticas, programas e projetos relacionados à AUP na Região Metropolitana de Fortaleza. Como conclusão, teremos que: 1 – Embora haja uma relação relevante entre a prática da AUP e a garantia pelo direito à cidade daqueles sujeitos que a praticam, raramente esse aspecto é evidenciado ou incentivado; 2 – A Região Metropolitana de Fortaleza pode ser considerada um exemplo disso, pois, apesar de a AUP possuir relevância na região, ela é dificilmente pautada pela ótica do direito à cidade; 3 – As políticas e projetos de incentivo e fomento à AUP na RMF são iniciativas pontuais e, em geral, possuem um viés reducionista e pouco intersetorial, o que compromete seu potencial de promoção do direito à cidade, já que este pressupõe, necessariamente, uma visão multidimensional das relações socioespaciais.
Conclusão | Autores: Alexandre Queiroz Pereira e Maria Clelia Lustosa Costa
A conclusão do livro convida o leitor a refletir sobre o tema central Reforma Urbana e Direito à Cidade passado à limpo a forma como os processos gerais de urbanização da sociedade se estabelecem na ordem próxima, a cidade de Fortaleza. Também convida os interessados a pensar juntos estratégias para redefinir os rumos da nossa cidade.